Infelizmente, mais uma vez se constata neste forum a ignorância generalizada e o preconceito religioso.
Mencionam a Igreja Católica como vilã nesta história, porém esquecem que a mesma é perita em humanidade.
De fato, esta Igreja, que é tão acusada de conservadora, retrogada e outras coisas, poderia ficar calada e não se intrometer no assunto, porém, estaria traindo sua missão e sua própria razão de existir. Ela deve denunciar toda e qualquer tentativa de abuso contra a dignidade humana em qualquer fase de sua existência. Não há qualquer interesse economico nesta denúncia, mas, o mesmo, não se pode afirmar sobre aqueles que defendem esse tipo de pesquisa.
A fim de lançar luzes sobre as trevas manifestas nesta discussão, segue entrevista da cientista Alice Teixeira Ferreira (Professora. Associada de Biofísica, da
UNIFESP/EPM, na área de Biologia Celular -Sinalização Celular) concedida à revista Médico Reporter em 13/10/2004, que ainda continua muito atual, e, acredito, poderá sanar algumas dúvidas e nos livrar da ignorância e do achismo. Afinal, trata-se da palavra de uma especialista:
1) Que argumento científico pode ser usado para manter a posição contrária a utilização de embriões na pesquisa das células tronco?
Vários:
a- a única linhagem de células-tronco embrionárias humanos(CTEH) obtidas pelo coreano Woo Hwang (veterinário) não se conseguiu ainda serem reproduzidas até mesmo pelo próprio pesquisador; surgiu por acaso.Esta linhagem foi obtida de 30 embriões humanos pela transferência nuclear de núcleos das células cúmulos do próprio ovário) para os mais de 200 óvulos de suas respectivas doadoras.
Obviamente estes 30 embriões humanos tiveram de ser mortos para se obter as suas células, sendo que cada
um deles fornece entorno de 150 células.É um número irrisório para um transplante, visto que no autotransplante
de CTadultas obtidas da medula óssea utiliza-se em torno de um milhão de CTs por mililitro, injetando-se 40 mililitros de um concentrado destas células na região lesada através de uma sonda/cateter introduzido na artéria femural,no caso de infarto do miocárdio ( Dr. Dohmman, HospitalPró-Cardíaco,RJ) ou doença de Chagas ( Dr. Ricardo Ribeiro dos Santos,Bahia).
b-o grupo do Dr. Murdoch, da Universidade de Newcastle, Reino Unido, que é uma das 5 equipes de pesquisa a
receberem aprovação para pesquisar em as CTEHs,no trabalho publicado agora em setembro (Reproduction,2004Sep:128(3),259-67) afirmam:
(b.1) -a cultura contínua das CTEHs num estado indiferenciado requer a presença de camada de células de
roedores e de hormônios de crescimento liberados pelas mesmas,havendo o risco de transferência de patógenos
(vírus ou bactérias causadores de doenças). Caso contrário elas começam a se diferenciar descontroladamente,
gerando uma mistura de diferentes tecidos, perdendo a sua propalada característica de pluripotência.
-as CTEHs demonstram grande instabilidade genômica e durante o crescimento a longo tempo apresentam
modificações funcionais inesperadas;
(b.2) -as CTHEs quando injetadas nas patas posteriores de roedores imunossuprimidos geram tumores
embrionários (teratomas) em 50% dos animais.
Estas " descobertas" mostram que esses pesquisadores não entendem nada de Biologia Celular, pois nós, que
pesquisamos na área há 15 anos com cultura de células, já evidenciamos todos estes problemas com as
chamadas células de linhagem, obtidas de tumores ou desdiferenciadas e eternalizadas.
2) Qual o objetivo do manifesto contra a utilização de embriões humanos em pesquisa?
Preservar a dignidade do ser humano. O ser humano não pode ser utilizado como meio de pesquisa. Como diz o
Prof. Alberto Oliva:-"A crescente transformação do conhecimento científico aponta para o risco de as
biotecnologias virem a tratar o homem não como um fim em si mesmo, mas como meio".O utilitarismo traz de
volta o mote romano: "A tua morte é minha vida".Existe alternativa que vem sendo utilizada com relativo
sucesso que é autotransplate de CT adultas obtidas
da medula óssea do próprio paciente ou as CTs adultas do cordão umbelical-placenta.
3) Há poucos dias a lei de biossegurança liberou a pesquisa com embriões congelados. E agora, o
que pode ser feito pelos grupos contrários a pesquisa? Há alguma providência em andamento?
As CTEHs dos embriôes congelados não servem para se fazer terapia celular por duas razões:
1ª) a medida que as células se diferenciam começam a apresentar um complexo proteico - MHC- responsável
pela resposta imune de tal maneira que serão rejeitadas pelo paciente. Não haverá pega do transplante e
surgirá um processo inflamatório tão intenso que o levaria a morte. Assim seria necessário a utilização por toda
vida de imunodepressores, nos casos de compatibilidade parcial.
2ª) o pior, no entanto, é a metilação descontrolada e não identificável do DNA e das histonas, nos
cromossomos. Como diz a Dra. Lygia Pereira, trata-se de células detonadas. Infelizmente tais embriões
humanos, tão maltratados pelo congelamento, podem gerar monstros.
4) Na sua opinião, quais os riscos que a pesquisa com embriões pode trazer para a sociedade?
Nos EUA oferecem 400 dólares por óvulo humano. Seria uma sedução para mulheres pobres. A Science 18 jun
2004 vol.304, 1742, Diane Schaub diz que estamos frente a nova forma de escravidão, com o espectro da
criação de embriões humanos para a pesquisa e interesses dos mais ricos.
5) A senhora acredita que a ciência será capaz de responder as expectativas criadas em relação aos
benefícios das células tronco?
Não é questão de fé, mas de muito estudo. Existem CTs em todos os tecidos e o que se precisa é investir no
conhecimento sobre a sinalização celular. Talvez não será necessário fazer auto-transplante de CTs se soubermos como fazer as CTs locais se multiplicarem mais e se transformarem nas células necessárias para reparar as regiões lesadas. Sobre este conhecimento repousa também a bioengenharia tecidual. Aqui na UNIFESP o casal Mônica e Silvio Duailibi já estão conseguindo produzir dentes com CTs adultas incorporadas num biopolímero com forma de dente.
6) Acredita que a liberação das pesquisas com embriões pode levar a clonagem e a bioindustria?
Não só isto. É uma brecha para se tornar legal o aborto no Brasil